1 de abr. de 1984

A vizinha louca e o homem do saco




Esse é talvez um dos últimos períodos realmente nebulosos da minha vida, tenho pouquíssimas recordações, mas aqui seguem elas...
Lembro da casa laranja da vizinha, que devia ter algum tipo de distúrbio mental, pois recordo de algumas vezes acordar a noite com ela gritando ou jogando grandes bolotas de barro na porta da nossa casa. Não lembro de ficar assustado com isso, mas lembro da mãe braba com o fato... e talvez algumas discuções com a senhora louca.
Morávamos em um bairro de classe médio-baixa, não era um local ruim as ruas eram totalmente calçadas e ficava a umas poucas quadras da região central da cidade. Nossa casa era cor verde-água com janelas brancas, totalmente de madeira. Neste período morávamos em cinco pessoas, Eu, minha mãe, duas irmãs dela e minha prima que tinha dois anos a menos que eu. Esse foi o meu seio familiar por muitos anos, basicamente fui criado em casa e rodeado por mulheres.
Não tinha amigos, brincava sozinho ou, algumas vezes, com a minha prima, fazer amigos foi sempre uma grande dificuldade, pelo menos até os meus dez ou onze anos, como vocês verão.
Minha mãe sempre foi muito severa, hoje, mais uma vez hoje consigo entendê-la, afinal não é fácil fazer o papel de mãe e pai na criação e sustento de uma família. Não tenho registros de brigas durante esse período, exceto a vez que jogando futebol sozinho na frente de casa, acertei um chute pela janela e a bola acertou uma imagem de Santo Antônio, derrubando-a e quebrando a cabeça da mesma. Naquele dia eu apanhei, seria a primeira de muitas, na grande maioria merecidas surras.
Durante uma parte do dia eu e a minha prima íamos a uma creche municipal que ficava a duas quadras de onde morávamos, mais uma vez poucas lembranças mas elas seguem:
Lembro de uma manhã nublada e nem tão fria quando fomos deixados na creche minha prima chorando agarrada no cercadinho da porta, pedindo para que a tia voltasse, lembro da vez que forçaram a comer fígado de gado, que eu obviamente não agüentei e guardo ânsia do cheiro até hoje. Uma boa recordação é da hora do soninho deitávamos todos em colchonetes azuis, como eu demorava a adormecer, ficava olhando para as outras crianças não sei porque mas guardo essa experiência na prateleira das “boas experiências“.
Uma outra pessoa fazia constantemente fazia parte da minha vida nessa fase, apesar de eu nunca o ter conhecido efetivamente.
O “homem do saco”, era a sim que a mãe chamava ele, um senhor idoso e muito humilde que passava de casa em casa vendendo aipim/mandioca/macaxeira (depende do lugar do Brasil aonde o leitor está), sempre maltrapilho e com um aspecto sujo, passei um bom tempo com medo dele, pois segundo a mãe e as tias, ele levava as crianças que não se comportavam adequadamente.

Por hora é isso, um abraço e uma viva bem…