1 de mar. de 1988

Uma princesa na minha vida


O verão de 88 é o primeiro que me lembro de ter sentido a sensação de férias. As férias para mim sempre foram diferentes, minha família precisava economizar recursos e sendo assim não saíamos de casa.
No primeiro dia de aula ainda lembro da grande maioria dos colegas comentando sobre suas viagens e aventuras nesse período, aqui no Rio Grande do Sul, quase todas as famílias vão para a praia nas férias, eu já havia conhecido a praia, mas não lembrava mais, minhas recordações se limitavam a algumas fotos, me deixava embaraçado o fato de não ter histórias para contar.
As férias de 88 foram as primeiras de muitas em que passei todo o período em casa, na maioria dos dias lendo ou assistindo televisão, no final das contas esse fato acabou me ajudando em mais aspectos do que atrapalhando, mas talvez parte da minha inabilidade em me relacionar, principalmente até os primeiros estágios da minha vida adulta, se devam à esse tipo de reclusão.
Em termos intelectuais o ano de 1987 não havia terminado bem, lembro que havia passado de ano, mas por indicação da própria professora, freqüentei o período de recuperação, como um reforço uma vez que era um aluno medíocre. O ano de 1988 começava muito melhor nesse aspecto, certamente não era o melhor aluno da turma, mas já estava longe da mediocridade do ano anterior (um viva para um verão de estudos).
Mas a lembrança mais significativa que guardo desse ano são as borboletas... (aprenderia esse termo muitos anos depois, mas é a melhor maneira de exemplificar o que senti...)
Aproximadamente no meio do ano de 1988, a minha turma acolheu uma estagiária do magistério, e eu me apaixonei... desde o primeiro dia. A delicadeza dos movimentos, a suavidade do olhar, a voz doce e o trato carinhoso, seus cabelos louros, tudo o que havia nela lembrava um tom angelical. Todos esses atributos contrastavam totalmente quando comparados com os da minha velha e amargurada professora da segunda série.
Sorte ou não naquele ano ainda, a professora original teve algum tipo de contratempo de saúde e a estagiária assumiria a turma por um longo e, para mim pelo menos, maravilhoso período.
Freqüentar a sala de aula não mais era um fardo, era um prazer, (mesmo que na época eu desconhecesse o significado do termo) e a cada tarefa eu me esmerava mais, não com o objetivo de aprender ou ser um aluno melhor, o esforço era de fato uma simplória tentativa de impressioná-la.
Tenho certeza de que não fui o único que nutriu algum tipo de paixão platônica por ela, afinal ela era REALMENTE muito bonita, tanto é que foi eleita uma das princesas da festa símbolo da nossa cidade, e olhando pra foto dela hoje, tenho ainda a certeza de que foi uma injustiça ela não ter vencido o concurso.
De todos os meus colegas eu me julgava, agora, o que mais tinha sorte, mamãe era uma das únicas que na época possuía carro, e me buscava no colégio todos os dias, lembro que nos dias chuvosos, o que na minha cidade é uma constante no inverno, ela dava carona para a então professora, recordo com exatidão que eu conseguia sentir o cheiro do cabelo dela sentada no banco da frente, ahhh como era bom... ainda nutro esse gosto, pelo cheiro do cabelo das mulheres, até hoje!
No dia que a minha velha professora retornou da licença, eu chorei... por amor, amor de criança, uma amor que nunca teria chance nenhuma de acontecer, mas que doeu como qualquer um dos outros. No auge dos meus oito anos ganhei a minha primeira cicatriz no coração, quisera eu que fosse a última, mas na verdade era apenas o prelúdio de uma história repleta de futuras desilusões.